Entrevista com essa magnífica banda carioca de Thrash Metal, a niteroiense Taurus, concedida pelos fundadores; os irmãos Cláudio e Sérgio Bezz, nesse ingrato período de pandemia, onde citam toda trajetória da banda com uma clareza sublime da experiência com o ímpeto jovial de quem ama o que faz.
por Marcelo Pereira de Souza
Com perguntas e respostas via whatsapp, fazendo alusão aos tempos modernos, O Taurus representado por CB (não é Casas da Banha, mas sim Cláudio Bezz) e SB (que não é Sugar Baby, mas sim Sérgio Bezz) mostram o quão maduros, sensatos, precavidos, inteligentes e coerentes são, falando o porquê da importância da banda no cenário tupiniquim visto não serem partidários (como muitos artistas se fazem hoje em dia) e forçarem as pessoas a refletirem sobre o momento vivido despertando em cada um seu modo de enxergar a vida. Confira abaixo:
Para quem ainda não os conhece, gostaria que se apresentassem e falassem dos trabalhos musicais e bandas que participaram?
Cláudio Bezz – Sou guitarrista e o Taurus foi minha primeira e única banda de metal onde toquei em todos os discos.
Sérgio Bezz – O Taurus sempre foi minha banda e já toquei em outras também, mas de metal somente num período no Extermínio e participei somente dos discos lançados do Taurus.
O Otávio tocou somente no Taurus, participando do “Signo de Taurus”, “Fissura” e “V’, além do dvd é claro. Em 2011 a banda tocou no documentário “Brasil Heavy Metal” ou “Super Peso Brasil” como ficou mais conhecido, com as músicas “Dias de Cão”, ”Mundo em Alerta” e “Massacre” sendo que ele ainda cantou no tema principal do filme junto com outros artistas (música “Desordem e Regresso”). Já o Felipe, participou de inúmeras bandas e as mais relativas são a “Sanatore” e da vocalista “Venus Lee” com participação no dvd dos 30 anos e no “V”.
Sabemos que viver do metal é bem complexo. Como vocês sobrevivem para pagar suas contas e se um dia tem esperança de viverem somente da banda?
CB – Sou músico formado na universidade, me preparei a vida toda para ser músico full-time como instrumentista, trabalhei em estúdio fazendo gravações acompanhando artistas faz mais de 30 anos, fiz mestrado e hoje continuo estudando fazendo doutorado em música e composição musical. Viver de música no Brasil nunca foi fácil como em qualquer profissão e meu conselho de viver no que você quer fazer, é estudar, interagir e se dedicar a área escolhida sendo pró-ativo, principalmente em algo ligado a arte pois vivemos num contexto hiper difícil.
SB – É muito difícil de sobreviver no Brasil de música, principalmente no metal. Sou psicólogo, não dependo da banda para sobreviver, mas isso facilita pela longevidade e principalmente que fazemos porque gostamos.
Poucas bandas gravam cd e dvd atualmente. O que vocês pensam dessa modernidade de hoje em dia como termo de divulgação e etc?
CB – Em toda história da música o que importa é o meio de comunicação. Hoje em dia temos a internet e nos comunicamos por ela mesmo e em todos os meios possíveis em áudio e vídeo. Permanece o cd, vinil, dvd e até fita k7 como relançamos na China, onde para mim as mídias não se esgotam e se renovam o tempo todo.
SB – Os formatos vão se modificando com o decorrer do tempo, sempre foi assim, rádio, vinil, mudaram a rotação… k7, cd, que teve uma queda abissal, dvd, blue-ray. Os fãs de metal gostam da mídia física, que ainda tem rotatividade grande. Sempre lançamos algo pelo nosso atual selo em formatos físicos e que não se opõem ao streaming digital dos dias atuais. Muitas bandas não lançam mais nada no físico (NR: o que não é o caso deles) e somente em plataformas digitais, mas o formato se recicla o tempo todo.
O primeiro trabalho “Signo de Taurus”, é um marco do metal nacional até os comparando a ser o “Metallica brasileiro”, mesmo sendo cantado em português. Conte resumidamente toda carreira até este último trabalho “Cinco”?
CB – O “Signo de Taurus” Foi gravado no final de 85 e lançado em 86. Em 88 lançamos o “Trapped in Lies” em inglês, com a saída do Otávio e chegada do Jeziel. Em 89 o “Pornography” também em inglês onde após isso foi feita uma pausa. Voltamos em 2010 com um novo disco, “Fissura”, com a formação original incluindo o Jeziel e desse jeito mantendo as duas formações numa única (quinteto). A partir daí lançamos o DVD em 2016 e agora em 2020 lançamos nosso recente trabalho o Taurus “cinco”!
SB – Em 85 fizemos uma demo-tape que foi lançada numa curtíssima edição (coisa de colecionador) e para não ficar redundante, meu irmão já explicou o restante.
Os meios sociais de hoje facilitam a divulgação de uma banda e consequentemente um número maior delas em que leva o público a não reparar com verdadeira atenção de outrora (a não ser que impacte imediatamente no gosto). Falem como a banda encarou e encara essas mudanças e se fosse uma escolha, iriam preferir os primórdios anos 80 ou o atual como cenário do rock?
CB – A internet é o fenômeno de hoje em dia, hiper-comunicação! Falam tudo e as pessoas leem o básico da escrita, sendo mais voltado para o lado visual. Acho algo natural. Não sou saudosista e vivo o hoje, aprendendo a utilizar as ferramentas disponíveis do momento e se a internet é um facilitador, vou usá-la. Uso a nossa história aplicada aos tempos atuais.
SB – Cada época deve ser vivida com as facilidades que ela nos oferece, onde temos os prós e os contras, e nesse sentido vivemos os anos 80 com bastante intensidade. Os recursos e referências de quem fizesse metal no Brasil eram escassos, então fazíamos com nosso descobrimento e garra. Hoje temos tutorial de como gravar, como fazer, como compor as músicas e etc, que facilita muito para quem quer iniciar. Então ter mais acesso hoje é algo muito positivo. Cada período tem sua particularidade e não temos preferência pois vivemos o momento.
O hiato da parada da banda (1994 a 2007) foi resultado de que? E a volta?
CB – Foi após o disco “Pornography”, mas ficamos fazendo shows em 91/92 e em seguida resolvi sair da banda por achar que o meio não estava dando nenhum suporte para shows, lugares fechando, falta de vinil, enfim um clima ruim no país. Nenhum problema com os membros. Eu, meu irmão e o Jean morávamos no mesmo prédio, então estávamos sempre nos encontrando. Cada um foi viver sua vida até que perguntavam pela banda e vimos uma nova demanda e por volta de 2006/2007 resolvemos ensaiar e voltamos de forma natural. Foi apenas uma pausa. Foi justamente a demanda da procura da banda pela internet que descobrimos ter um grupo no antigo Orkut sobre nós com muitas pessoas (mais de 2000), onde achamos muito bacana e resolvemos ensaiar e retornar com a banda.
SB – Talvez o início da década de 90 tenha sido difícil, espaços se fechando chegando a nos deixar desanimados com coisas que iam acontecer e não aconteceram como esperávamos, além de outros fatores. Aliados a isso, começamos a amadurecer e a necessidade de me sustentar começou a aparecer. Eu me formei em psicologia indo para especialização em psicanálise (NR: nem perguntei se ele tratou de algum roqueiro) que foi um caminho profissional no qual estou muito engajado. Segui meu caminho, mas sempre me mantendo na música. Com o fortalecimento das redes social alguns grupos começaram a resgatar nossa banda, o que nos animou para ter o encontro de um ensaio, que imediatamente engatou outros, surgindo logo a vontade de compor. Com a possibilidade de retornar aos shows, naturalmente voltamos a ativa.
Devido a qualidade dos músicos e das músicas, porque a banda não decolou internacionalmente? Muito se falou na época por ser cantado em português, mas quais reais motivos e contatos estrangeiros que tiveram?
CB – Sobre a língua, em 86 foi uma questão importante pois tentamos lançar o “Signo de Taurus” na Alemanha e o português foi uma barreira. Nesse período para se lançar no exterior tinha que cantar em inglês, que sempre foi uma ideia nossa, mas depende de vários fatores e infelizmente não aconteceu conosco. Cada um tinha sua vida, onde ficamos reticentes de tentar a vida em outro país por não ter respaldo de nada. Preferimos ficar com os pés no chão por aqui mesmo. Eu pelo menos não me arrependo disso!
SB – Isso é um trabalho árduo que precisa contato, parceria e investimento. Fizemos isso timidamente por conta de mudanças radicais de ir pra fora, ralar, divulgar, sendo algo sacrificante e exaustivo e nos anos 90. Não tivemos condições de dar esse passo, e entramos num certo desânimo com o cenário do metal (NR: lembrando que nessa época teve o polêmico movimento “grunge” que uns acharam que somou e outros que afundou o metal de vez). Hoje temos algumas possibilidades de fazer algo na américa do sul através da nossa gravadora e achamos interessante.
Num certo “clichê”, como são feitas as composições e letras?
CB – São feitas naturalmente. Cada fase tem sua melhor maneira de ser feita. No primeiro disco, tínhamos tempo de sobra, morávamos com os pais e tínhamos tempo para ficar ensaiando direto. Cada período foi um momento estratégico diferente para compor , mas em geral compomos sempre juntos (nos 3 primeiros discos foi naturalmente assim). A partir do “Fissura”, durante os ensaios sempre gravamos algumas coisinhas, um groove, uma levada; daí a música fica pronta primeiro para depois vir a letra e a questão da voz. Eu componho um riff, levo pro ensaio, faço uma pré-produção em casa, daí levo pro estúdio de novo e aí discutimos num trabalho em conjunto, e assim vai. Desde o “Trapped in Lies” temos amigos parceiros que escrevem letras conosco e desde então não foi diferente.
SB – Desde o começo foi assim. Nos reunimos no estúdio para ensaiar onde soltamos a criatividade das levadas, bem soltas, e a partir daí colocamos as letras (Otávio, Cláudio, amigos, Beto de Gásperis).
O Jeziel foi um marco na banda até por certa semelhança com James Hetfield. Qual real motivo de sua saída e como o público reagiu ao novo line-up na época?
CB – Ele ficou desde “Trapped in Lies” e mesmo na pausa que demos, falávamos e nos encontrávamos. Na volta em 2007 ele estava junto, compusemos o “Fissura” também, mas ele chegou a gravar somente uma música e resolveu sair porque morava em Friburgo e logo depois aconteceu aquele desastre de deslocamento de terra que morreu muita gente, inclusive familiares dele. Alguns falaram que foi por motivo religioso, o que é mentira. Jeziel é um cara muito prático, inteligente, escreve e compõe bem, um bom músico, enfim, para nós um amigo, um irmão, que mesmo com a semelhança física com James Hetfield na época, estava ali como integrante da banda.
SB – Tocou no segundo disco até a interrupção estando com a gente em shows, inclusive gravou o “Fissura” e por questões descritas pelo meu irmão em 2010 ele resolveu não seguir mais na banda. Ele é professor de música, muito inteligente, um excelente letristra e quando saiu o Otávio já estava na banda, daí os vocais foram supridos, e o baixo foi assumido pelo Felipe.
Aproveitando a pergunta anterior, e como foi o retorno do Otávio? Em termos atuais da banda: Vivem ainda com saudosismo ou tem aquela eterna chama rebelde do rock n roll, já que cinquentões?
CB – Após a saída do Jeziel, quem passou a integrar a banda foi o Beto de Gásperi (baixista), cujo primeiro show foi no Canecão abrindo pro Testament, que por sinal foi excelente. Fizemos toda turnê com ele e o público reagiu muito bem. Logo depois tivemos a volta do Otávio e o Beto teve que sair por ir morar nos EUA à trabalho. Encontramos com nosso querido e atual baixista, Felipe Melo (NR: não é o pitbull do Palmeiras), que já está há 10 anos na banda. Ele faz a cozinha junto com meu irmão e aceitação dele foi ótima. É um excelente músico, super baixista, hiper guitarrista, enfim um baita músico que só trouxe benefícios para a banda e nem se fala para o público já que os comentários são sempre positivos.
A volta do Otávio foi ótima, ele tem uma voz sensacional e um carisma enorme onde só vem a somar. Saudosismo como dito anteriormente, sabemos do que marcou a história da banda, mas vivemos o momento e hoje temos várias maneiras de pensar sobre as músicas e produção musical, da própria sonoridade dos discos e vivemos disso. Pensamos nisso desta maneira sem saudosismo e sempre com o pé no metal. A ideia de viver da banda não existe mais, é algo idealista, da adolescência, mas somos maduros e o Taurus é nossa ligação com a história.
SB – Estávamos fazendo shows e na primeira fase do retorno ele foi na estreia, ali ele se animou em retornar. Em alguns shows posteriores fez participações até se fincar novamente como o vocalista principal. O primeiro show dele foi em São Paulo. Quanto a viver da banda, não temos esse fundamento, mas temos uma direção, o que acontecer será natural. Amamos o que fazemos e temos a banda como uma família. Isso vale mais que qualquer expectativa.
Vocês surgiram durante o primeiro Rock in Rio e tirando o hiato são quase 35 anos de metal. O que vocês aconselhariam para a molecada de hoje que quer formar uma banda de metal?
CB – Isso vale para qualquer um que tenha um projeto na vida, independentemente da idade que estiver. Seja perseverante, façam as coisas que acreditam de verdade que isso no futuro vai ter importância pois vai mostrar a relação com suas certezas e verdades. É importante a pessoa saber em que acredita, no que quer fazer e claro não deixar o lado prático das coisas pensando no lado da verdade. Fazer o que acredita!
SB – Foi um impulsionador muito importante. Éramos adolescentes na nossa “rede social presencial” daquele tempo, nos encontrávamos em shows. Diria ao pessoal mais novo para aproveitar essa tecnologia de encontrarmos estudos do instrumento na internet, se dedicar e juntar amigos para fazer apresentações e se daí surgir algo que vá adiante… valer aproveitar, mas tentar e acreditar sempre no que faz.
Como surgiu a ideia e o contato do selo chinês em lançar o “Trapped in Lies” de forma analógica e em fita K7?
CB – Foi o “Signo de Taurus” e o “Trapped in Lies”. Um produtor chinês por iniciativa dele resolveu nos procurar. Achei muito louvável editar da forma correta sem pirataria. Sobre a volta da fita k7 é a mesma coisa pra volta do vinil, ou seja, as pessoas querem ouvir outra tecnologia, seja nova ou retrógrada e sabemos que sempre estamos renovando sonoridades.
SB – Procuraram a gente assim como outras bandas para isso. Por mais curiosidade pitoresca que exista, vimos que tem uma busca por este formato, seja como ítem de colecionador ou não. Acredito que seja algo colecionável, mas vi um grande interesse mundial na volta principalmente do vinil e k7.
Focando o último trabalho “V” (NR: cinco, como fazem questão de frisar por estar em português), fale sobre as participações dos músicos convidados (Alex Camargo, Louzada e Beto de Gasperis)?
CB – Chamamos ele de “cinco” e não de “five” por estar relacionado a língua portuguesa. A participação dos nossos amigos Alex Camargo (baixista e vocalista do Krisium), Luiz Carlos Louzada (vocalista do Vulcano) e Beto de Gásperi (baixista e ex-Taurus), foi uma relação de amizade que queríamos muito fazer participações com eles. Encontramos com o Alex num show em Manaus, inclusive ele escreveu um texto no nosso dvd que está lá no encarte e queríamos muito trabalhar com ele em relação a música, onde compusemos uma canção pensando no seu vocal e os enviamos onde prontamente colocou sua voz e ficou sensacional. O Luiz, participou também no dvd cantando “mundo em aleta” com o Otávio e outras participações em shows e finalizando, o Beto, esse nosso amigo compôs a maioria das letras continuando a ser um ex-integrante muito presente nas nossas vidas.
SB – Decidimos fazer esse disco com a colaboração de amigos e procuramos as pessoas que tiveram e tem participações conosco em shows, projetos em conjunto ou qualquer parceria positiva. Em 89, o Carlos da Dorsal fez uma participação no “Pornography”, então já fazíamos isso na década de 90 e reativamos com músicas que tinham mais a ver com cada um dos participantes.
Falem sobre os temas desse último trabalho, sobre o que falam as letras, composições e o que inspirou nesse trabalho?
CB – O início da composição dele foi bem antes da pandemia. O lançamento foi nos primórdios de março antes do lockdown. Em relação as letras, é sobre o descontentamento com o momento político-social que vivemos já desde antes, sendo um disco de certa maneira afirmativo, onde coloca o que acreditamos em primeiro plano: somos contra racismo, qualquer tipo de preconceito, somos a favor da liberdade de expressão em qualquer meio e maneira, sendo isso nosso foco. É um disco que mostra nosso repúdio com o “status quo” político e social que nos encontramos. Estamos em lockdown desde março para proteger o próximo e temos consciência de que as letras (não só a música) tem impacto nas pessoas. De uma forma geral são mensagens para você refletir e procurar sobre seus valores e ao mesmo tempo afirmar suas convicções, cada música dentro de uma temática.
SB – Sempre tivemos a preocupação com as mensagens que passamos e esse disco, assim como o “Fissura”, foi inicialmente feito em inglês (NR: oba, quero essa pérola gringa também!), mas resolvemos fazê-las em português porque queríamos passar nossas mensagens para o público aqui do Brasil. Fala do que vivemos no nosso âmbito social, nos absurdos, no momento negro de nossa história político-social, ética e moral em vários sentidos. A música “Dark Phoenix”, que inclusive é a que o Louzada (Vulcano) participa, fala exatamente de uma esperança de um renascimento do caos pelo mundo em destruição. O Brasil está em “chamas”, sendo depauperado, então uma ave (fênix) de símbolo de ressurgimento no intuito de olhar para frente, reconstruir, de trabalhar para construir com intuito do pensamento positivo para suprir o momento sombrio que vivemos.
Essa é uma questão delicada hoje em dia. Costumeiramente, roqueiros costumam ser de esquerda, anti-sistema e no momento de turbulência política do país (NR: que não é nenhuma novidade), alguns músicos se posicionam politicamente falando (NR: desnecessário no meu ponto de vista em se tratando de banda, pois diria que o rock é anárquico), não só no metal como em outros estilos, vide os medalhões da era da ditadura. No metal alguns músicos expressaram suas posições políticas, assim como surgimento de super-grupos como o “Revolta” (João Gordo, Koslene, Prika e Cavalera entre outros), causando burburinhos como aconteceu no show do Roger Waters. O que a banda ou músicos pensam a respeito desse assunto?
SB – Esse tema é muito explosivo e temos que ter certo cuidado em responder para, sem precisar fugir da raia. Como banda, não apoiamos nenhum partido político, mas sempre tomamos partido em relação a ideias. Nosso país tem uma injustiça social indecente, muitas diferenças de oportunidades… é urgente a luta para que os mais desfavorecidos tenham direito à dignidade de condições de vida. A política no Brasil segue a corrente global de resumir-se a slogans de marketing, dificultando muito de fazer pensar, e em geral as discussões são muito superficiais. Sabemos que mesmo alguns com boas intenções se corrompem pela máquina do poder. Somos contra a opressão de ideias, as ditaduras, a censura, contra o racismo, e também de todo tipo de movimento que queira aniquilar as minorias. Esses são temas presentes em nossas letras. Entendemos que a política não se resume a partidos políticos, mas a atitudes do dia a dia de cada um. A polarização partidária do nosso país faz parte do jogo eleitoral, de quem vai estar no poder, dar a canetada e ter o poder de decidir coisas importantes para a sociedade (NR: você conhece o verdadeiro caráter de uma pessoa dando poder ou a vendo acuada). Os conflitos de interesses são normais, o problema é que sempre quem paga a conta é o povo. Como banda nunca fomos de apoiar governo X ou Y, por mais que individualmente tenhamos nossas posições político-partidárias. Quanto ao artista ou banda tomar um posicionamento partidário, vai ter como em qualquer assunto dessa natureza, uma avalanche de manifestações prós e contras. A liberdade de cada um expressar o que quiser é necessária. O Taurus se pronuncia em nossas letras, e tocamos em muitos problemas sociais, políticos, subjetivos, seja de âmbito nacional ou mundial desde nosso início.
Comparando o cenário de antigamente com o de hoje, principalmente nesse período de pandemia com trabalho em home-office na maioria, mudou algo para a banda no sentido de reflexão e outras coisas que o distanciamento possa influir em alguma melhora para a banda?
CB – Não há resultado bom em nenhum sentido com a pandemia. Fora as mortes e desgraça alheia, nossa vida de “encontros” está completamente parada, sem ensaios com dois shows grandes cancelados que deve ocorrer ano que vem. Em relação à economia, todos os países estão sofrendo com isso e mesmo com a facilidade da internet temos feito o que podemos em relação a banda com “lives”, vídeo-entrevistas com cada um em sua casa, mas de bom essa pandemia não trouxe nada (NR: nem em termos de reflexão da vida?).
SB – Tudo ruim; o país parou. Temos feito lives, participamos de festivais on-line muito legais como no festival da Roadie Crew e Heavy Metal Rock, e agora vamos fazer mais um num evento beneficente, enfim estamos trabalhando nos espaços que são possíveis nesse momento, esperando a reabertura para os encontros pessoais e com o público.
Thrash Metal cantado em português (francês e outras línguas fora o inglês) é bem peculiar e vocês executam magnificamente este papel. O timbre do Otávio se encaixa muito bem. Já deram conta e refletiram sobre essa soberania, visto de terem sido cobrados provavelmente pelo “sistema” em usar a língua universal?
CB – Essa relação vem desde 86 já explicado anteriormente. Hoje em dia a língua não é mais uma barreira, as pessoas escutam principalmente metal em qualquer idioma (NR: concordo plenamente vide sucesso do “SOAD”), seja em eslavo, escocês, inglês, alemão, japonês (que existia desde os anos 80), que na primeira audição possa parecer estranho, mas nos acostumamos. No nosso caso em português é melhor porque acaba nos encontrando também com o texto. A métrica e maneira de cantar, a prosódia que é o que a gente trabalha, é uma forma importante que fazemos com o Otávio sendo um entendimento da agressividade da voz com a clareza do que se fala, tudo isso junto com o som. O francês que você disse ser uma linguagem estranha para o metal eu discordo e é apenas uma questão de costume.
SB – Agradeço pela sua menção e nós também adoramos nossa trilha em português. Temos burilado muito, porque gostamos de nossa língua, mas é inegável o quanto a língua inglesa é a língua oficial do rock mundial. Sabemos de toda dificuldade em encaixar timbre e sonoridade com o canto na língua portuguesa. Nossa preocupação é com a mensagem sonora de forma a interagir a letra com o timbre e sonoridade que favoreça o entendimento e a clareza no nosso thrash metal. É um trabalho árduo de equalização, repetições e muita dedicação. Eu particularmente gosto de escutar metal em outras línguas que podem trazer algo de novo para o som pesado. Não vamos abandonar o português, mas também não desdenharemos do inglês.
Na comemoração dos 30 anos da banda lançaram um DVD ao vivo. Soube da ideia de ser feito um DVD autoral nos 35 anos. Conte um pouco desse futuro trabalho, se já está todo planejamento e etc? Vocês recuperam todo investimento, já que o headbanger quase não compra mais material físico?
CB – A ideia é de gravar dentro do estúdio e com público, uma apresentação nossa e não necessariamente com composições inéditas. Esse esboço não é para ser feito no Brasil e sim por algum lugar na américa do sul. Em relação à custo, sempre conseguimos suprir o mesmo, já que é um custo de fábrica e as empresas que participam desse processo sempre conseguem rever seu gasto investido com uma certa liquidez. Agora, lucro é outra história. Claro que se vende mais do que se gasta, mas não é nada estratosférico visto que não vivemos num meio musical que é do mainstream, mesmo com um público gigantesco do metal. As plataformas de “streaming” disponibilizam as músicas também como spotify, itunes, amazon e etc, o que ajudam a safar o custo da produção.
SB – Não pensamos em nada especificamente para os nossos 35 anos. Fizemos vários trabalhos e vamos nos encontrando, lançamos novo disco, clipes, trabalhando na rede, eventualmente fazendo lives. Os shows em breves voltarão a surgir. Há todo um merchandising novo, que esperamos levar para os shows, e já está disponível pela internet em nossa página, além do nosso selo, Dies Irae, que tem uma rede muito grande de venda no Brasil e no exterior. É feito um trabalho contínuo que se paga, e ainda tem um bônus por já termos um certo nome consolidado no cenário.
Como anda a agenda da banda, shows, expectativas, perspectivas e futuro?
CB – Dos projetos futuros, temos uma parceria com a Dies Irae que é nossa gravadora e que lançou o “Cinco”, relançou o “Fissura” em cd com “bônus track” além do vinil dos dois discos e o futuro dvd citado anteriormente. Quanto as previsões de show, estamos parados como todo mundo no aguardo da liberação e comprovadamente estarmos resguardados dessa pandemia. Tudo muito incerto e por enquanto estamos fazendo e divulgando trabalhos via internet e quando liberar vamos ávidos em divulgar nos shows nosso último trabalho.
SB – Com lançamento do novo álbum, lógico que estamos loucos para apresentá-lo ao público nas principais capitais do país, no norte e nordeste e por onde nos chamarem. Alguns festivais tivemos que postergar a data como o “Abril Pro-Rock” em Recife, o “Armageddon Metal Fest” e outros festivais prorrogados por conta dessa maldita pandemia. Gostamos muito de tocar em festivais no Brasil, fizemos alguns como o “Zumbi Ritual” que aconteceu em Santa Catarina com maravilhoso espaço open-air, o “Ruídos do Sertão” no interior da Bahia, “Otacílio Festival” lá em Santa Catarina, “Guaru” em São Paulo, que são festivais importantes que participamos. Queremos também estar na ativa em muitos outros. Consideramos uma festa, pois há contato entre os amigos, bandas e público. Tendo uma estrutura boa para os músicos e público, adoramos e estamos esperando por essa reabertura em breve.
Para finalizar, quais surpresas os fãs (NR: me incluo nessa) podem esperar?
CB – Nosso trabalho é sempre de crescimento e pensando nos próximos passos. Em breve vamos colocar o “V” na estrada, fortalecer a ideia do dvd em estúdio fora do país, o relançamento em vinil como dito, e como fui produtor do “Fissura” e do “V”, temos uma maneira de operar e fazer esses trabalhos mais concentrados e voltado internamente, tornando mais fácil e rápido de finalizar. Então é bem provável de termos um próximo disco sem tamanho distanciamento de tempo de lançamento. Muita lenha temos para queimar. Obrigado pela entrevista e muito em breve espero encontrar todos!
SB – Estamos com muita expectativa da reabertura, contando com a volta dos shows, e de contarmos com nossos “convidados-amigos” participantes do disco, conosco no palco. Que tudo volte a funcionar, principalmente do lado cultural, do cenário de metal brasileiro para fazer acontecer os eventos, shows, que são de extrema importância para o encontro das bandas com seu público, que vem a ser o ápice do entretenimento. Todo trabalho de estúdio, produção e etc, depende desse estímulo que recebemos do público nesse ponto de chegada, que é o palco. Vamos atravessar este período sombrio, sobreviver a ele, e como uma fênix ressurgir das cinzas, como a capa do disco (feita por Alcides Burn, de Recife) que representa o que está por vir, assim que as coisas abrirem.
Obrigado a você pela entrevista, ao “Mosh” que estamos presentes desde o início (NR: desde a primeira edição), onde criou-se uma amizade que o metal propicia, seja do trabalho que a imprensa nos proporciona mutuamente para caminharmos juntos com o aval do público. Um grande abraço a todos e um até breve!