Por Emerson Mello
Poucos álbuns de estreia são tão fortes e definitivos como o Holy Diver. O frescor, a energia e a criatividade entregues aqui mostram que Dio estava surfando num dos melhores momentos da sua carreira. E olha que ele já tinha passado por dois dos maiores ícones do Rock – Rainbow e Black Sabbath, tocando ao lado de lendas vivas da guitarra como Ritchie Blackmore e Tony Iommi e nos brindou com dois dos maiores álbuns de Rock de todos os tempos: Rising e Heaven and Hell.
Dio começou a negociar com a gravadora quando ainda estava no Black Sabbath, Tony Iommi não sabia de nada e foi surpreendido quando ele deixou a banda e já estava com todo o seu circo montando pra lançar o álbum e além disso ainda levou consigo o baterista Vinnie Appice, deixando o iron man sem rumo. Recrutando o jovem e talentoso Vivian Campbell, que veio da banda irlandesa Sweet Savage – pertencente ao movimento NWOBHM, as seis cordas estavam entregues em boas mãos. Fechando o time temos o experiente baixista escocês Jimmy Bain, ex-colega de banda de Dio no Rainbow. Com um time destes o jogo estava ganho. Com produção do próprio Dio, as gravações aconteceram no famoso Sound City Studios em Los Angeles, por onde dezenas de famosos gravaram seus álbuns, nomes como Elton John, Santana, Neil Young e a geração que veio depois de Dio como Nirvana, Guns and Roses, Slayer, Metallica e outros. A capa feita pelo artista gráfico Randy Berrett, mostra a mascote Murray com uma corrente em mãos tentando capturar um padre mergulhado em águas turbulentas. Dio de antemão avisa que a verdade por de trás da imagem pode ser exatamente o contrário do que ela aparentemente nos mostra: “você não pode julgar uma imagem pela forma como ela aparece, você tem que ver dentro da pessoa e não julgá-la pela aparência ou pelo que ela veste”. Todo o conceito de Holy Diver é baseado nisso.
Musicalmente Dio seguiu um novo caminho, não soando nada parecido com suas bandas anteriores forjando seu próprio estilo: um Hard Heavy de muita qualidade, calcada em riffs de guitarra poderosos, solos explosivos e uma cozinha ultra sólida e logicamente seus poderosos vocais. Em termos líricos soltou de vez a sua veia para contos de fantasia, com forte influência de literatura, uma das paixões de Dio. O disco abre com o pé na porta com Stand up and Shout trazendo um riff cortante de guitarra e uma bateria rápida e precisa de Appice. Campbell vem com um solo alucinante, como se fosse uma espécie de Gary Moore (uma das suas maiores influências) do Metal, mostrando o que já podemos esperar do disco. Sem deixar o ouvinte respirar, na sequência temos o mega clássico Holy Diver, música título. Após um intro misteriosa com alguns efeitos de vento e uivos entra um riff pesado e cadenciado sendo impossível não balançar a cabeça junto. A música soa perfeita, com excelentes performances de todos, Appice usando e abusando dos contratempos na bateria, Jimmy Bain segurando tudo com elegância, Campbell destruindo num dos melhores solos do álbum e Dio fazendo o difícil parecer fácil. No documentário Metal: A Headbanger’s Journey, Dio declarou que Holy Diver era uma espécie de desabafo em relação a sua educação católica, onde segundo ele havia uma distorção da verdadeira mensagem da religião. Em vez de ensinar por amor, as freiras mantinham a ordem batendo nas crianças com réguas e dizendo que iriam para o inferno se não se comportassem. Trechos da letra também são inspirados no Apocalipse (Revelations) da bíblia.
Seguindo em Gypsy temos mais riffs de guitarra e Dio nos conta a história de uma cigana, e é melhor você ter cuidado com ela pois ‘She could crack your brain’. Em Caught in the Middle temos um dos momentos mais Hard do álbum, com um refrão que fica na cabeça, sendo musicalmente uma canção mais direta. “Don’t Talk to Strangers, apesar de poucos saberem, foi composta em parceria com Jake E Lee. Ele e Dio chegaram a trabalhar juntos, mas acabou não dando certo, por incompatibilidade de visão de trabalho e de temperamento. Uma pena, pois em pouco tempo já fizeram este clássico, dá pra imaginar o que eles teriam feitos juntos trabalhando em um álbum completo. Campbell mais uma vez brilha, num grande solo e Appice quebra tudo. Straight Through the Heart mais uma música bem direta, sem firulas e manda sua mensagem “But here it comes again/Straight through the heart”. Invisble, apesar de pouco badalada, é uma das minhas preferidas do disco. Rainbow in the Dark, música que 11 entre 10 headbangers se empolga quando toca, acabou se tornando o maior clássico da carreira solo do Dio. A música Evil Eyes ficou de fora do disco, sendo lançada apenas como B-side. Uma música boa, mas talvez pela sua similaridade com “Rainbow in the Dark” não entrou no álbum.
Holy Diver é considerado um dos maiores clássicos do Heavy Metal, chega aos seus 40 anos com edições comemorativas sendo lançadas e também uma homenagem do guitarrista Paul Gilbert, que regravou diversas músicas da carreira de Dio, incluindo Holy Diver. Comercialmente também é o maior sucesso de Dio, disco de prata no Reino Unido e platina duplo nos Estados Unidos. O legado de Dio é eterno, cabe a nos dar continuidade e passar as gerações que estão chegando. Afinal ‘We’re rainbow in the dark’.
*Ficha técnica
Banda – Dio
Álbum – Holy Diver
Lançamento – 25/05/1983
*Line-up:
Ronnie James Dio – vocais/sintetizadores
Vivian Campbell – guitarra
Jimmy Bain – baixo/teclados
Vinnie Appice – bateria
Músicas:
01 – Stand Up and Shout 3:06
02 – Holy Diver 5:51
03 – Gypsy 3:39
04 – Caught in the Middle 4:14
05 – Don’t Talk to Strangers 4:53
06 – Straight Through the Heart 4:31
07 – Invisible 5:24
08 – Rainbow in the Dark 4:21
09 – Shame on the Night 5:20
Tempo Total 41:29