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28 Mar 2024, 10:58 pm

Demolição Sonora Com Immolation Em São Paulo


Immolation @ Fabrique, São Paulo – 29.04.2018

Texto: Henrique de Paula
Fotos gentilmente cedidas por Pei Fon/ Rock Meeting

O Fabrique Club, na Barra Funda, São Paulo, está se tornando lentamente um templo para os apreciadores paulistanos do rock e do heavy metal. O espaço perfeito para eventos de médio-pequeno porte, o ambiente agradável e a ótima localização tornam a casa uma escolha mais do que adequada para os produtores paulistanos. No gênero do metal extremo, a casa já acolheu nomes como Satyricon e Obituary, no ano passado, e agora recebeu a lenda do death metal americano, Immolation. A produção desta vez foi da Tumba Productions, que depois de um hiato de cinco anos, está de volta às atividades e reservará ainda muitas alegrias aos fãs do metal extremo neste ano. O evento foi muito bem organizado, com apresentações pontuais e um cast de bandas certeiro. Os americanos do Immolation, praticantes de um death metal soturno e técnico, foram acompanhados dos bolivianos do Corporal Jigsore e da lenda brasileira do black metal, Mystifier. Divulgando seu novo álbum, lançado em 2017, “Atonement”, um dos melhores registros do grupo, a banda americana aportou no Brasil para duas datas, uma em Recife, no tradicional festival Abril Pro Rock, e esta em São Paulo, que agora relatamos.

CORPORAL JIGSORE

Os bolivianos de Santa Cruz de la Sierra subiram ao palco às 18h05, para uma apresentação que surpreendeu pela visceralidade. O Corporal Jigsore pratica um death metal de muito peso, que alterna, com esmero, velocidade e cadência, e exibe como destaque a potente voz de Rotten (Luis Jimenez, também baixista), os solos de guitarra de Gabriel Pavez (substituindo Julio Toro, que não acompanhou a banda nesta turnê) e o toque feminino de Adriana Pynaia na bateria. Quando digo “toque feminino”, porém, não imagine que Adriana alivie nas baquetas, pois ela bate com força, dona de um estilo conciso, mas eficiente. A banda, que não detém popularidade em nossas terras, certamente deixou sua marca, e seu nome não será mais apenas associado ao Carcass (“Corporal Jigsore Quandary” é o nome da segunda música do clássico disco “Necroticism” da banda inglesa), na clara homenagem dedicada à banda. Com o logotipo do grupo no telão fazendo fundo ao massacre sonoro realizado, o som alto e “na cara” foi lentamente conquistando, ao longo da apresentação, a plateia paulistana, o que digamos é um grande feito, já que esta não é exatamente composta por um público fácil, acostumado que é com os grandes nomes da cena local, nacional e internacional. Quase todas as canções foram prenunciadas por introduções gravadas, o que conferia um clima diferenciado ao show, que só incluiu canções do terceiro e último disco “Unleashing The Pestilence”, de 2017. Ressalto a execução da faixa título do último disco, de letra quase recitada e andamento que lembra um pouco o trabalho dos gaúchos do Krisium, a rápida “Manufactured Apocalypse”, e a já clássica da banda (o que percebemos pela reação de alguns da plateia) “Dark Supremacy”, que encerrou a presença do conjunto sul-americano na noite. Ótima apresentação dos bolivianos que, se não tivessem nos conquistado pelo som, o teriam, certamente, pelo carisma e simpatia, especialmente de Rotten, comunicativo o tempo todo, vestindo uma camiseta do Torture Squad (admirada com orgulho, seguramente, pelo baterista Amilcar Christófaro, presente na pista). Quarenta minutos de uma apresentação que, prevejo (e desejo), abrirá portas ao retorno do grupo ao país.

MYSTIFIER

A horda baiana, cuja origem remonta ao final dos anos 80, subiu ao palco aproximadamente às 18h55, para espalhar a palavra do Senhor (das profundezas) aos ouvidos paulistanos. A careca tatuada do quase folclórico Beelzeebubth e sua guitarra dourada, cor do magma do Hades de onde saiu, a maestria de Diego DoUrden manejando teclados, baixo e o vocal do inferno, e a presença discreta, mas eficiente, de Warmonger, atrás de seu kit, porém não escondido, fizeram o cenário do teatro satânico que sempre configura a apresentação do Mystifier. Petardo seguindo petardo, após a abertura com “Unspeakable Dementia” (do disco “Profanus”, de 2011), os baianos provaram que não é preciso ser sisudo e indiferente para ser “true”, e que black metal é feito na raça, e na raça de seu povo, como o Mystifier é uma prova irrefutável. A banda que não se permite subjugar por modismos estrangeiros, sem deixar, porém, de humildemente reconhecer e venerar suas influências, fez uma apresentação emocionante. Saudada com respeito pelos paulistanos e muito aplaudida após cada som, a banda não escondia o orgulho de estar presente “em uma data especial, na presença de Immolation”, que como disse Beelzeebubth, com enfático sotaque, é um grupo que “ouvia na adolescência”, e “fazia cover de Sepultura, no início da carreira”. Bela revelação sobre os americanos (que, eu confesso, desconhecia, mas que hoje se pode comprovar no Youtube) de alguém presente na cena desde seu início. Sim, Beelzeebubth, “é bom ouvir gringo pagando pau de banda brasileira”, sempre… Pentagramas, cruzes invertidas, corpse paint, correntes, botas e braceletes com “spikes”, são a carregada indumentária desta encarnação demoníaca que despejou clássicos de seus álbuns “Wicca” e “Goetia” (do início dos anos 90), para a satisfação de seus antigos fãs (e de um João Gordo, discretíssimo no canto da pista, ao menos até ser revelado pelo guitarrista, orgulhoso de sua presença). Como não poderia ser diferente, canções clássicas como “Osculum Obscenum” e “Aleister Crowley and Ordo Templi Orientis” estiveram presentes, além de uma honrosa homenagem ao Sarcófago, com o cover de “Nightmare”. O relógio marca 19h42 quando a banda se despede do público com o dever cumprido, após feitiços lançados, visões do reino do Anticristo, brindes e saudações a Satanás, e tudo o que você espera de um verdadeiro show de black metal. O Mystifier é, para nós e para o mundo, a evidência irrefutável de que nada supera a autenticidade do estilo praticado no Brasil.

IMMOLATION

Foto: Pei Fon/ Rock Meeting

20h07 é a hora precisa do início da demolição sonora da noite. Os membros originais e fundadores Ross Dolan (baixo e vocal) e Robert Vigna (guitarra), acompanhados de Steve Shalaty (desde 2003 no posto de baterista) e Alex Bouks (na segunda guitarra, já não tão novato, desde 2016), compõem hoje a falange destruidora que atende pelo nome de Immolation. O público é apenas mediano em quantidade, mas grandioso em entrega e veneração pelos americanos. E isso não pode ser menosprezado, já que, se de alguma coisa entendemos aqui no Brasil, é de música extrema (já que no resto, na política, na educação, na vida social, é melhor não comentar…). “The Distorting Light”, do novo disco lançado em 2017, “Atonement”, abriu as portas para a devastação sonora que qualificou a apresentação dos americanos. “Make some fuckin’ noise!”, urra Dolan, frase que repetiria ainda algumas vezes na noite. Quando a música acaba, ninguém tem dúvidas de que o zumbido instalado em nosso ouvido não nos deixará por, no mínimo, uma semana…

“When The Jackal Comes” do mesmo álbum, vem na sequência, rapidamente. A estratégia da banda está evidente: não nos deixar respirar ou descansar… O som dissonante e pesado do Immolation é sufocante e causa vertigens, e dali em diante o ser notório na noite é Robert Vigna, com seu jeito absolutamente peculiar de agitar enquanto toca sua guitarra, empinando-a bruscamente para cima, lançando notas e gestos no ar, comportando-se como uma espécie de maestro do apocalipse. A experiência apenas se intensifica com “Father, You’re Not a Father” cuja letra é a mais pura demonstração de que o Immolation pode agradar tanto aos fãs de black quanto de death metal, neste testemunho de desprezo pela religião que é uma das marcas características da banda, especialmente em seu álbum “Close To A World Below” de 2000 (uma olhadinha na capa do “play” já basta para comprovar…).

Dolan cumprimenta o público ao final da canção, dizendo que a noite de domingo é uma ocasião verdadeiramente perfeita para estar ali (a emenda do feriado que o diga!). Uma pequena roda de alucinados começa com o início abrupto e direto de “Swarm of Terror”, única tocada do disco “Harnessing Ruin” de 2005. É nítida a satisfação da banda que pede os “horn signs” ao público, prontamente atendida. A marcante “Magesty and Decay”, do álbum homônimo de 2010, é acompanhada pelos gritos da plateia que seguem a cadência da música, enquanto o movimento da roda se intensifica. Bouks é tão eficiente quanto impassível, e Shalaty tão preciso quanto carismático. “Once Ordained”, de “Failures for Gods” de 1999, só não é impecável porque o vocal de Dolan falha em alguns momentos, detalhe pequeno e quase imperceptível quando olhamos para a empolgação de Vigna em cima do palco.

Foto: Pei Fon/ Rock Meeting

A introdução sinistra de “Thrown To The Fire”, do novo álbum, paradoxalmente dá frio na espinha, e a excelente canção mostra que o Immolation não precisa viver do passado, como comprova a intensidade crescente da insana roda na pista. A essa altura, entrar na brincadeira da galera já é um risco, e o perigo não diminui com a direta e reta “Kingdom of Conspiracy”, do disco de mesmo nome, de 2013. A canção tem um andamento complexo, difícil de acompanhar, como, na verdade, é algo bastante particular e típico do som do Immolation. “Destructive Currents”, também do novo álbum, vem logo depois de Dolan saudar a todos e dizer que é bom retornar à capital paulistana. Sua voz está novamente nítida e com toda força nesta canção, seguida do clássico comemorado pelos fãs “Into Everlasting Fire”, do debut “Dawn of Possession” de 1991, que comprova que o som dos americanos nunca foi de fácil assimilação. Mas o inferno se instala definitivamente na casa com a extrema “Den of Thieves” de “Hope and Horror”, EP de 2007. Com o fim de sua execução, o público se sente à vontade para pedir diversas músicas que gostaria de ouvir, enquanto Ross Dolan ri, divertindo-se.

Frustrando um pouco a expectativa dos que esperavam por mais clássicos, mas não a dos que acompanham de perto o novo trabalho da banda, a magnífica “Fostering the Divide”, do novo álbum, que possui um interessante lyric video no Youtube, é executada. Os fãs, então, podem se regozijar com “Immolation”, do primeiro álbum, colocando o Fabrique à baixo, seguida do encerramento da noite, a clássica “Close To a World Below”, e seu final insano, com solo impactante do maestro Robert Vigna. A banda deixa o palco rapidamente, diante dos fãs satisfeitos que recebem do baterista diversas cópias do setlist, além das disputadas baquetas. Shalaty, então, surpreende, descendo do palco para tirar fotos com os fãs e distribuir autógrafos na pista, enquanto o restante da banda já está no backstage, descansando depois de quase uma hora de apresentação. E até agora o zumbido na cabeça não me abandona…

 

CORPORAL JIGSORE

1-Intro 1 – Infernal Domain

2-Intro 2 – Salve Muerte

3-Bleeding Earth

4-Intro 3 – Unleashing The Pestilence

5-Manufactured Apocalypse

6-Intro 4 – La Via Dei Serpenti

7-Dark Supremacy

 

MYSTIFIER

1-Unspeakable Dementia

2-Osculum Obscenum

3-An Elizabethan Devil Whorshipper’s Prayer Book

4-Aleister Crowley And Ordo Templi Orientis

5-The True Story About The Doctor Faust’s Pact With Mephistopheles

6-Nightmare (cover do Sarcófago)

7-Beelzebuth

8-Defloration (The Antichrist Lives)

 

IMMOLATION

1-The Distorting Light

2-When The Jackals Come

3-Father, You’re Not A Father

4-Swarm Of Terror

5-Majesty And Decay

6-Once Ordained

7-Thrown To The Fire

8-Kingdom Of Conspiracy

9-Destructive Currents

10-Into Everlasting Fire

11-Den Of Thieves

12-Fostering The Divide

13-Immolation

14-Close To A World Below

 

Mosh Live · News

Postado em maio 14th, 2018 @ 11:40 | 2.199 views
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