Por Emerson Mello
No álbum anterior Never Say Die, o relacionamento com Ozzy já estava bem desgastado, sendo que ele chegou a ser demitido, depois voltou e terminou de gravar o álbum pra ser demitido novamente depois quando a turnê terminou. Paradoxalmente quem apresentou Dio a Tony Iommi foi Sharen Osbourne(na época Sharon Arden) que naquele tempo ainda não era casada com Ozzy, sendo que ela e Iommi eram amigos bem próximos. Musicalmente Ozzy e Dio tinham características bem distintas e obviamente cada um seu próprio estilo. Iommi declara que quando começaram a tocar com Dio eles puderam explorar mais coisas o que resultou numa sonoridade diferente do som que a banda vinha fazendo. Dio conta que quando se conheceram a amizade e a química rolou instantaneamente, então marcaram um encontro pra relaxar e tocar algumas coisas. Children of the Sea era uma música que começou a ser feita com Ozzy, porém com outra letra e outra melodia totalmente diferente, que chegou a ter um registro em demo, mas que Tony Iommi não sabe onde está guardada esta gravação. Quem sabe algum dia ela apareça… Neste primeiro encontro eles terminaram a música de primeira e já deram a cara que eles têm hoje. Martin Birch, que já tinha um trabalho renomado com Deep Purple e Rainbow veio pra pela primeira vez produzir um álbum do Sabbath e fez um grande trabalho. O álbum foi gravado no Criteria Studio – mesmo estúdio que foi gravado Technical Esctasy e no Felber Studios em Paris. O nome de Birch foi sugerido por Dio, que já havia trabalhado com ele nos três primeiros álbuns do Rainbow.
Curiosamente o conceito da capa não foi feito especificamente para o Black Sabbath, mas é certo dizer que foram feitos um para o outro e caiu como uma luva pro conceito que a banda trazia. Criado pelo pintor Lynn Curlee, a arte foi inspirada numa foto antiga, em teoria que teria sido feita em 1928, onde algumas moças estavam fumando no intervalo de um ensaio de teatro. Como elas interpretavam anjos na peça estavam com asas em suas costas, a qual Curlee chamou a pintura de Smoking Angels. Curlee entrou em contato com a Warner Bros Record oferecendo a arte, que a principio seria usada pelo Blue Oyster Cult. A coisa acabou não indo a frente e alguém da equipe do Black Sabbath entrou em contato querendo saber se ele tinha algo que serviria para a banda, já que estavam com o prazo apertado e não tinham nada definido quanto a arte. A pintura era perfeita com o conceito da música título e então foi definida a capa. Curlee levou em torno de quatro a seis semanas pra pintar a arte e fez na técnica acrillic on canvas, onde no original o detalhe das asas aparecem por completo. Alguns anos depois ele vendeu a arte original, mas não se lembra pra quem. Com certeza hoje deve estar valendo um bom dinheiro.
Apesar do álbum ser um clássico e ser um mega sucesso e ter tido uma receptividade muito positiva, nem tudo são flores nos bastidores da produção do álbum. O baterista Bill Ward declara que não se sentiu nada a vontade no novo direcionamento musical que a banda seguiu com Dio. Apesar desta opinião, sempre reconheceu Dio como um grande cantor e entre suas músicas preferidas estasvam Lonely is the Word e Children of the Sea. E as polêmicas e controvérsias não param aí. Craig Gruber ex-baixista do ELF (banda que Dio cantava antes do Rainbow), alega que gravou assim como compôs muita coisa no álbum e afirma que não foi o baixista Geezer Butler que gravou e que ele nunca foi creditado por isso. Iommi respondeu dizendo que Butler regravou as partes de baixo e sem ouvir o que foi gravado por Gruber. Pra encurtar a história, Gruber afirma que fez um acordo financeiro vantajoso para compensar por não ter sido creditado no álbum e a história se encerrou por ai. Coisas dos bastidores do business do Rock’n’Roll.
A despeito das polêmicas, não tem como tirar o brilho de Heaven and Hell, que mostra um Black Sabbath musicalmente revigorado, já começando o álbum com a rápida e vigorosa Neon Knights. Tanto a sonoridade quanto as novas letras mostram que a banda seguia um novo rumo “Circles and rings, dragons and kings/Weaving a charm and a spell/Blessed by the night, holy and bright/Called by the toll of the bell”. Com certeza os fãs sentiram a diferença. Um amigo me confessou que na época ele demorou pra entender o Heaven and Hell, pois achava que o Black Sabbath estava copiando o som do Rainbow. No solo Iommi mostra que está afiado. Children of the Sea, que teve a letra reescrita por Dio e com uma nova melodia, acabou se tornando uma das mais marcantes desta fase. Ela começa lenta, com Dio cantava suavemente até crescer com a banda trazendo todo peso. A passagem instrumental do meio, que antecede o solo, é digna de nota, inclusive eles colocaram um monge real fazendo aquele coro e depois reproduziram em overdub pra dar aquela sensação de coral. Lady Evil vem pro lado mais Rock’n’Roll lembrando alguns momentos mais despojados do ELF e do próprio Rainbow no primeiro álbum. Fechando o antigo lado A, temos a épica e candidata a uma das melhores músicas de Metal de todos os tempos, a própria música título. Quem não se empolgar com este riff certamente está morto. A eterna dualidade do bem e do mal, que tanto atrai o Heavy Metal, está perfeitamente descrita por Dio nesta letra. Tudo nela soa perfeito, o baixo na cara, as guitarras de Tony Iommi a interpretação magistral de Dio. Ela mantém um andamento cadenciado, meio que num mantra onde o baixo dá toda a sustentação e a bateria a pulsação até acelerar no final e chegar no seu ápice para aí entrar um dedilhado delicado de violão que passa aquela sensação de calmaria. Obra-prima!
Wishing Well mantém a pegada, abrindo o antigo Lado B , rápida direta e o destaque fica por conta do vocal de Dio. Die Young usaram um arranjo bem diferente do que eles tinham feito até então, com a introdução com uma cama de teclado feita por Geoff Nichols e Iommi colocando diversas camadas de guitarra até a banda entrar com tudo. No meio da música o recurso de arranjo que Iommi chama de ‘luz e sombras’, ou seja, alternar momentos rápidos com partes lentas, o que realmente dá um efeito interessante. Curioso como nestas partes lentas o vocal de Dio se destaca ainda mais. Walk Away é outra na linha de Lady Evil, seguindo uma linha mais Hard e bem interessante. Lonely is the Word fecha o álbum com um riff que me lembra um pouco Scorpions e um andamento mais cadenciado que a torna bem interessante, enquanto Dio canta “Hang your head and take my hand/It’s the only road I know”. Solo de Iommi é viajante e ele explora um pouco da sua influência jazzística e Bluesy. Uma das minhas preferidas da banda e fecha muito bem o álbum.
Heaven and Hell é considerado por muitos um dos melhores álbuns de Heavy Metal de todos os tempos, inclusive sempre estando bem posicionado nas famosas ‘listas’. Foi o álbum que deu um novo fôlego à banda e voltou a despertar o interesse da audiência e comercialmente é um dos álbuns do Black Sabbath com melhor vendagem, na época ocupando um excelente posto nas paradas. Só temos a agradecer a estes mestres por terem concebido este obra-prima que ficou registrada pra eternidade.
*Ficha técnica
Banda – Black Sabbath
Álbum – Heaven and Hell
Data Lançamento – 25/04/1980
*Line-up
Ronnie James Dio – Vocais
Tony Iommi – Guitarra
Geezer Butler – Baixo
Bill Ward – Bateria
*Musico adicional – Geoff Nichols – teclados
*Músicas:
Lado A
01 – Neon Knights – 3:53
02 – Children of the Sea 5:34
03 – Lady Evil 4:26
04 – Heaven and Hell 7:00
Lado B
05 – Wishing Well 4:07
06 – Die Young 4:45
07 – Walk Away 4:25
08 – Lonely Is the Word 5:51
Tempo Total 39:46