Emerson Mello
Gary Moore certamente foi um dos guitarristas mais viscerais que já passaram neste planeta. Por raras vezes se viu (e se ouviu) alguém com tamanho nível de entrega ao instrument: seja em um estádio lotado ou em um pub, ele está lá tocando sempre como se fosse a última vez. Versatilidade também é outra característica latente, e ao longo da sua carreira Gary Moore passou com muita desenvoltura por estilos diversos: desde o Hard Blues psicodélico do Skid Row ao Prog Fusion do Colesseum II, passando pelo Hard Clássico do Thin Lizzy até o Classic Rock do BBM (chamado por alguns de Cream II). E ainda viajou pelo Fusion, Metal, AOR, Blues ao longo dos seus 18 álbuns solos.
Apesar das suas raízes Blues, tendo como referência os mestres do Blues americano como Albert King, Albert Collins, BB King e Peter Green (do Blues britânico), curiosamente até então ele nunca havia feito um album inteiro dedicado ao estilo. Os álbuns da segunda metada de década de 1980 estavam vindo numa pegada mais pesada, tendo até mesmo participação do madman Ozzy Osbourne na música Led Clones, do album After the War de 1989. Por sugestão do seu companheiro de banda, Bob Daisley, ele resolveu se aventurar no Blues e o resultado foi um tremendo sucesso, sendo comercialmente o seu álbum melhor sucedido. No Brasil a música título chegou a ser tema de novela, serve de referência para se medir o nível de popularidade que a música atingiu. Mais tarde, após a morte de Moore, Bob Daisley organizou e produziu um tribute ao seu amigo, chamado ‘Moore Blues For Gary’, com diversos músicos incluindo John Sykes, Don Airey, Glenn Hughes e outros.
No repertório ele escolheu alguns clássicos do Blues e fez releituras bem interessantes, com uma pegada mais atual e dando seu toque inconfundível. Mas foi com uma composição de sua propria autoria que o album se tornou um grande sucesso – a própria a música título. Produzido pelo próprio Gary Moore em parceria com Ian Taylor, Still Got the Blues entrega o que se espera de um album de Blues: um som orgânico, despojado e com execuções no clima de ‘ao vivo’. A lista de músicos que participaram do album foi grande, sendo que ele usou dois bateristas, dois tecladistas, dois baixistas, mais naipe de metal e cordas. Moore teve a oportunidade de tocar ao lado de seus ídolos Albert Collins e Albert King e do amigo George Harrison, além de músicos como Don Airey que já havia tocado com ele no Colosseum II, Brian Downey ex-colega de Thin Lizzy e Andy Pyle (ex-The Kinks) e o baixista Bob Daisley (ex-Ozzy Osbourne/Uriah Heep). A capa mostra um Gary Moore criança tocando guitarra no quarto com foto de seus ídolos na parede (sendo a mais visível a de Jimi Hendrix), enquanto a contra capa mostra um Gary Moore adulto, mostrando que os anos se passaram mais ‘ainda se tem o Blues’ – Still Got the Blues numa tradução livre.
O álbum abre com Moving On com Moore esmerilhando o slide, curtinha e rápida com menos de três minutos já prepara o clima para próxima música, nada mais que Oh Pretty Woman, clássico de Albert King do clássico album Born Under a Bad Sign (1967). O mais interessante é que o próprio Albert King participa tanto da gravação em estúdio quanto do video. Muito legal ver a referência e todo respeito que Moore tem pelo seu mestre. Na sequência mais uma regravação, desta vez para o clássico Walking by Myself de Jimmy Rogers. A releitura respeitou o clima da original, só dando uma repaginada e um toque mais atual, sendo outro grande momento do album. Still Got the Blues é a próxima, música que dispensa apresentações, um dos grandes momentos de inspiração de Moore, tanto na composição, como na letra e solo. O lindíssimo arranjo de cordas só faz crescer mais ainda a música. Vale também conferir algumas versões ao vivo (disponíveis no You Tube), onde a música cresce ainda mais. Em Texas Strut o clima volta a esquentar e nela Moore faz homenagens a ZZ Top, Stevie Ray Vaughan tanto na letra e também citando alguns riffs e trechos vocais da La Grange.
Começando o antigo lado B, temos o clássico Too Tired de Johnny Guitar Watson com a participação de Albert Collins. A combinação de duas escolas do Blues (Americana e britânica) funcionou muito bem com uma química perfeita. King of the Blues composição de Moore, uma homenagem a Albert King, é uma das minhas preferidas do disco. Falando do Rei, As the Years Go Passing By é outra regravação do mestre, e Moore tentou manter o clima da original. Poderia ter chamado o mestre pra divider os vocais com ele, seria um momento ainda mais incrível! Midnight Blues é outra composição de autoria de Moore e funciona muito bem também. That’s Kind of Woman composição de George Harrison onde o próprio participa e faz os backing vocais, a guitarra e o slide. Como curiosidade Eric Clapton gravou esta música praticamente na mesma época, sendo que Moore lançou um pouco antes. All Your Love composição de Otis Rush é outro clássico do Blues, com seu riff que fixa na mente e belo arranjo de metais foi mais uma escolha acertada de Moore pro repertório. E fechando o album, não poderia faltar uma regravação de um dos seus mestres, no caso Peter Green do Fleetwood Mac – Stop Messin’ Around. Nesta releitura Moore procurou manter o clima da original e o resultado também foi muito bom.
Still Got the Blues foi um grande sucesso, que deu uma repaginada na carreira de Gary Moore abrindo outros horizontes dentro da carreira dele comercialmente falando e também para que ele tivesse confiança pra seguir dentro do caminho do Blues. Com album completando 34 anos agora neste mês de março e se aprocimando o aniversário dele (04/04) é uma excelente oportunidade pra revisitar o album.
*Ficha técnica
Artista – Gary Moore
Álbum – Still Got the Blues
Data Lançamento – 12/04/1990
*Line-up:
Gary Moore – vocais/guitarras
Andy Pyle – baixo
Bob Daisley – baixo
Brian Downey – bateria
Graham Walker – bateria
Don Airey – teclados
Nicky Hopkins – teclados
Mick Weaver – piano
Martin Drover – trompete
Raul d’Oliveira – trompete
Stuart Brooks – trompete
Andy Hamilton – saxofone
Frank Mead – saxofone
Nick Payn – saxofone
Nick Pentelow – saxofone
Gavyn Wright – cordas
*Participação especial:
Albert Collins – guitarra
Albert King – guitarra
George Harrison – guitarras, vocais
*Músicas:
01 – Moving On 2:38
02 – Oh, Pretty Woman 4:24
03 – Walking by Myself 2:55
04 – Still Got the Blues (For You) 6:08
05 – Texas Strut 4:50
06 – Too Tired 2:49
07 – King of the Blues 4:34
08 – As the Years Go Passing By 7:42
09 – Midnight Blues 4:57
10 – That Kind of Woman 4:28
11 – All Your Love 3:39
12 – Stop Messin’ Around 3:52
Tempo Total 52:56