O aguardado segundo álbum da banda Matanza INC, Retórica Diabólica, chegou devastando tudo no cenário nacional, com aquele rock pesado e despojado. O disco saiu em parceria com o selo Estelita de Recife.
O Matanza INC conta com os integrantes do Matanza, que havia encerrado as atividades em 2018. O baterista Jonas Cáffaro e o baixista Dony Escobar acompanham o guitarrista, compositor e fundador da banda Marco Donida. O vocalista Vital Cavalcante (ex-Jason e Poindexter) completa o time.
Retórica Diabólica é um álbum que não apenas expande fortemente os horizontes musicais da banda como reforça as estruturas de sua identidade melódica. As letras seguem sarcásticas e provocativas, levantando questionamentos sobre a nossa percepção dos problemas do mundo. Justamente para falarmos um pouco mais sobre esta obra, conversamos com o guitarrista Donida. Leia e confira o som!
Para começar de um jeito leve, quase clichê, o “INC” adicionado ao nome da banda é uma clara referência ao Venom, certo?
Sim, começou como uma piada interna e acabou ficando. No primeiro momento pensamos em procurar um nome qualquer para batizar o projeto, porque íamos apenas gravar as músicas que já estavam prontas e que acabariam descartadas. Mas, conforme os trabalhos foram tomando vulto, nós fomos ficando cada vez mais envolvidos com a música, até que ficou óbvio que não faria sentido pararmos de tocar.
E na parte musical, quais são os principais artistas ou bandas que provêm ideias para vocês?
A minha influência eterna é o Mano Negra. Preciso ouvir Mano Negra pra lembrar porque é tão importante tocar com uma banda. Mas eu ouço sim muita música procurando elementos que levem as composições por lugares diferentes. Coisas mais objetivas como Sleep e Electric Wizard ou mais subliminares como Les Baxter ou Robert Drasnin. O importante é que a influência esteja distante para que você possa transpor uma ideia de uma outra realidade para a sua. Sendo algo muito próximo corre-se o risco de acabar limitado à repetição. Se você faz um som Slayer e só ouve Slayer fica difícil acrescentar ao que já foi feito.
E qual é o fato novo, ou quais, que o “INC” traz? Em outras palavras, o que é que não existia, ou não era tão importante, anteriormente, e agora é parte fundamental da banda? (Seja em relação às letras, arranjos, ideias…)
A terminação INC marca uma nova fase na banda. O nome Matanza continua porque sou eu quem compõe o material desde a formação da banda. Fiz todas as músicas, escrevi todas as letras, desenhei todas as artes e desenvolvi todos os conceitos dos álbuns. Então, artisticamente, não muda muito. Eu apenas continuo fazendo o que venho fazendo há mais de 25 anos. É péssimo ter de ser tão autorreferente pra responder a uma pergunta, mas se eu não defender meus créditos eles me são subtraídos. Quanto aos objetivos, estes sim são muito diferentes, como também as prioridades. Agora o prazer de estarmos juntos fazendo música nos basta. E o que vier disso será bem-vindo.
A banda teve um certo azar por ter começado pouco antes da pandemia, certo? Como vocês lidaram com a frustração de ter que interromper abruptamente um início tão promissor? Foi possível aproveitar o período para criar?
Foi uma merda mesmo, mas considerando tudo de ruim que a pandemia trouxe, ter interrompido um trabalho de divulgação chega a ser o de menos. Sim, tínhamos muitos planos e coisas marcadas que não pudemos realizar, mas o que importa é que passamos bem e nenhum de nós teve qualquer problema grave, ao contrário de tantos que perderam a vida. O que realmente deu pra fazer foi trabalhar nas composições novas. Ficamos trocando arquivos e cada um de sua casa foi gravando suas partes. Assim desenvolvemos todos os arranjos do disco novo.
Ainda sobre a pandemia, nas letras de algumas canções do Retórica Diabólica, como “Tudo Destruído” e “Sórdida Agenda Secreta”, parece ecoar a frustração enorme que todos nós, brasileiros, vivemos durante o período. Está correta essa interpretação?
Corretíssima! Eu não queria fazer um álbum temático sobre a pandemia, até porque todos já estávamos saturados desse assunto, mas impossível não manifestar seus reflexos. As letras do Matanza sempre resvalaram na fantasia e no absurdo para, através do exagero, chegar às emoções. Agora, não precisa mais! Estamos de fato diante de uma realidade absurda e caótica, onde alegorias chegam a ser desnecessárias. A frustração é um sentimento que hoje, infelizmente, nos conecta muito fácil.
Seria o próprio nome do álbum parte dessa crítica? E, caso seja esse o caso, vocês pretendem continuar a tanger questões políticas nos próximos trabalhos?
Retórica Diabólica trata da defesa do indefensável. Nós ouvimos tantos argumentos insanos ultimamente, percebemos tanto desprezo pelo bom senso, tanta hipocrisia descarada, que fica evidente a estratégia de inviabilizar qualquer diálogo racional. E aqui chegamos ao âmago da questão: o ser humano como protagonista de sua própria ruína, que é um desdobramento da “odiosa natureza humana”. A política é um entre tantos meios pelos quais a nossa humanidade corrupta se manifesta. Não os movimentos políticos em si interessam, mas o que se lê nas entrelinhas: egoísmo, ganância, sordidez… e isso com certeza é tema para letra no Matanza
Como estão os shows de divulgação do novo disco?
Os shows são sempre uma alegria porque são a oportunidade de fazer as coisas com os parceiros que se tornaram grandes amigos. Voltar a cidades do interior e rever uma galera que de outra forma seria muito difícil. Estamos no pior momento econômico do país em anos, então procuramos fazer tudo dentro da realidade, de forma que todos fiquem felizes, sem falsas expectativas.