Por Emerson Mello
Em termos de Rock, um dos nomes ou das marcas que mais cresceram nos últimos anos sem dúvida foi do Queen. O filme lançado em 2018 despertou a curiosidade em torno do nome do quarteto britânico angariando novo fãs e Brian May e Roger Taylor tem conduzido isso de forma que o nome da banda continua em alta. A enxurrada de bandas tributo que surgiram nos últimos tempos mostra que o fenômeno está forte e vem mantendo o folego.
Fato é que o público em geral só tem conhecimento da fase pós anos 80, ficando a fase setentista praticamente relegada ao ostracismo, com exceção de clássicos como We Are The Champions, Bohemian Rhapsody e Love of my life. Quando se fala de uma pérola como este álbum de estreia o desconhecimento é enorme, contribui também que a própria banda não inclui praticamente nada desta fase no repertório.
É importante lembrar que o Queen começou fazendo um som pesado, bem próximo ao que depois veio a se chamar Heavy Metal, e este álbum de estreia é a confirmação disso e tem tudo aquilo que a gente vê em várias álbuns de estreia: muita garra, muita vontade e zero de preocupação com o aspecto mercadológico da coisa, só mesmo muito tesão da banda em mostrar seu som ao mundo, como se fosse um manifesto “ei estamos aqui, nós somos o Queen”. A banda incluiu a frase “sem sintetizadores!” no encarte do álbum, uma ideia de May, o que reforça esta ideia.
O Queen sempre foi uma banda peculiar no sentido de composições, pois não são muito comuns as famosas ‘parcerias’ e sim cada membro compondo individualmente, com raras exceções. Freddie Mercury compôs cinco das dez músicas e Brian May compôs quatro, sendo “Doing All Right” co-escrita com Tim Staffell da banda Smile. Roger Taylor compôs e cantou “Modern Times Rock’n’Roll”, sendo que neste primeiro álbum não tem nenhuma composição de John Deacon. Gravado em Londres nos estúdios Trident Studios e De Lane Lea Music Centre contando com a produção de Roy Baker, John Anthony e pela própria banda, o frescor e a visceralidade estão intactos e dão a cara do como a banda realmente soava naqueles tempos.
Keep Yourself Alive começa com a clássica guitarra de Brian May ‘marcando’ o ritmo com vários efeitos tipo phaser e também com várias camadas de guitarras, o que virou sua marca registrada. A cozinha entra forte e vigorosa, sem demais firulas fazendo o que a música, dando uma coesão sinfônica no resultado final. No solo as também clássicas dobras de guitarra de May nos chama a atenção e nos fortes, melódicos e afinadíssimos backing vocais já percebemos que tem algo diferente nesta banda. May compôs a música quando ainda era adolescente e pensou nela num tom mais irônico, mas a perspectiva mudou quando Freddie Mercury cantou. Na sequência temos a belíssima Doing All Right com uma interpretação magistral de Mercury e um bonito trabalho de May ao violão, pra no meio da música entra o peso com um solo de guitarra. A música veio da antiga banda de Brian May, o Smile, foi composta em parceria com Tim Staffell e teve muitas mudanças em seu arranjo até chegar a esta versão final do Queen, que ficou um meio termo entre algo acústico ao violão e piano e alternando com o peso das guitarras. Na sequência a história de Great King Rat, uma composição interessante sendo o tal king rat uma personagem bem interessante, e a letra carrega uma ponta do humor ácido britânico. My Fairy King trabalha bem aquele esquema de vozes sobrepostas, que também virou marca registrada da banda, sendo que aqui alguns agudos são assinados por Roger Taylor. Ao contrário de Doing All Right, que May tocou o piano, em My Fairy King Mercury é quem toca. May gostou tanto do resultado que daí em diante Mercury assumiu de vez as partes de piano da banda. A letra fala a respeito de Rhye, um mundo fantasioso (“In the land where horses born with eagle wings/And honey bees have lost their stings”) criado por Freddie Mercury, onde algumas personagens são inspiradas nele mesmo ou em seus familiares – “Mother Mercury Mercury/Look what they’ve done to me”. Assim encerramos o lado A.
Liar começa o segundo lado do disco, trazendo um Rock mais clássico, focado nos riffs e nas guitarras. No meio tem uma espécie de batida tribal na bateria com Mercury cantando versos como “Mama I’m gonna be your slave/All day long/Mama I’m gonna try behave/All day long” e o instrumental vai crescendo e o baixo de Deacon surge roncando raivoso num solo urgente. Sem dúvidas um dos melhores momentos do álbum. Após a tormenta de Liar, temos The Night Comes Down surge como bonança, bela e calma privilegiando o formato de canção com o violão mais a frente. A letra reflexiva de Brian May fala do medo do envelhecimento e questionamentos da vida adulta “Oh, oh, the night comes down/And I get afraid of losing my way/Oh, oh, the night comes down/Ooh, and it’s dark again”. Devido a grande admiração de May pelos Beatles é possível que os versos “Lucy was high and so was I/Dazzling, holding the world inside”, sejam uma citação a Lucy in the Sky with Diamonds. Praticamente emendada e pegando todos desprevenidos entra Modern Times of Rock’n’Roll rápida e básica com Roger Taylor nos vocais. Son and Daughter indiscutivelmente a minha preferida do álbum, sendo uma das composições mais pesadas que a banda fez. Um riff magistral de May e Mercury cantando de forma mais agressiva, a na produção a banda manteve uma certa ‘sujeira’ na sonoridade saturando os vocais de Mercury, o que deu um clima ainda mais pesado na música, até mesmo pra combinar com a forte letra “The world expects a man/To buckle down and to shovel shit/What’ll you do for loving/When it’s only just begun?”. Jesus composição de Freddie Mercury a saga de Jesus de Nazaré. A música começa mais cadenciada pra ganhar peso e velocidade na parte do solo, onde Brian May colocou guitarras sobrepostas solando ao mesmo tempo criando um efeito diferente. Encerrando o álbum temos Seven Seas of Rhye. Aqui ela aparece numa versão instrumental, pois Freddie Mercury havia escrito somente uma parte dela. No álbum seguinte Queen II, ela aparece completa numa versão já com letra.
De maneira geral o álbum foi bem aceito pela crítica na época, com uma resenha bem positiva na Rolling Stone, apesar de ainda tímida nas paradas, sendo a melhor posição um trigésimo segundo lugar nas paradas britânicas. E assim se encerra este clássico álbum de estreia do Queen, pedra fundamental da discografia da banda que ficou na história como uma das maiores e mais influentes bandas de todos os tempos.
*Ficha técnica
Banda – Queen
Álbum – Queen
Lançamento – 13/07/1973
*Line-up:
Freddie Mercury – vocais, piano, Hammond, backing vocais
Brian May – guitarra, violão, piano, backing vocais
Roger Taylor – bateria, vocais, backing vocals
John Deacon – baixo, backing vocais
*Músicas:
Lado 1
01 – Keep Yourself Alive (May)
02 – Doing All Right (May/Staffell)
03 – Great King Rat (Mercury)
04 – My Fairy King (Mercury)
Lado 2
05 – Liar (Mercury)
06 – The Night Comes Down (May)
07 – Modern Times Rock ‘n’ Roll (Taylor)
08 – Son and Daughter (May)
09 – Jesus (Mercury)
10 – Seven Seas of Rhye (Mercury)